Decifre a política, se não ela te devora
Por Célio Barcellos
Na mitologia grega há uma obra intitulada Édipo Rei, escrita por Sófocles no 5 séc. (a.C). O resumo da estória mostra que Édipo mata o seu pai (Lion) e se casa com a sua mãe (Jocasta). O casamento com sua mãe ocorre após decifrar o enigma da esfinge e destruir o monstro que atormentava a cidade de Tebas.
Pois bem, se não decifrarmos o enigma da política, corremos o risco de sermos engolidos por ela. Há pessoas que somente pelo fato de se mencionar o nome “política” elas desaparecem, pois a palavra gera uma certa náusea. Contudo, até o momento, a sociedade não inventou algo mais eficaz para administrar a "polis" (cidade em grego). Quem sabe ainda surja!?
No jargão popular, a sentença, "todo político é ladrão", ganha notoriedade em função da maneira com que a política nacional é conduzida, uma vez que as leis produzidas parecem favorecer uma certa camada da sociedade, dentre ela, os políticos.
Procure ler este texto sem preconceito e sem paixão partidária. Compreenda que é apenas uma reflexão acerca de um assunto que interage conosco a todo tempo.
Neste domingo (06), os brasileiros vão às urnas escolher prefeitos e vereadores para as gestões municipais em todo o Brasil.
O grande dilema é a inocência do eleitor em depositar na política e em políticos o meio de proporcionar felicidade para ele e para a sua família.
Munidos de estratégias um tanto maquiavélicas, muitos políticos sabem disso e se aproveitam do romantismo com que as pessoas tratam a questão.
Em virtude disso, por ocasião das eleições norte-americanas em 2008, Michele Obama disse de forma aberta para os americanos votarem em seu esposo, pois ele iria consertar a alma das pessoas. Acerca dessa afirmação de Obama, William Kristol, escreve com um certo tom de ironia para o The New York Times o artigo “It’s about Him”, que diz o seguinte:
“… não precisamos trabalhar para melhorar nossas almas. Nossas almas quebradas podem ser consertadas votando em Barack Obama. Não precisamos lutar ou nos sacrificar para ajudar nosso país. Nossas vidas desinteressadas e desinformadas podem ser mudadas escolhendo Barack Obama. A América pode se tornar uma nação da qual se orgulhar se nos deixarmos liderar por Barack Obama”.
Perceba que o problema só muda de endereço. Se na América do Norte é possível afirmar algo assim, não se escandalize quando um candidato a presidência da República do Brasil dizer que vai "zerar a fome" no país (algo impossível de acontecer num mundo egoísta), uma vez que o próprio Jesus Cristo disse que os "pobres" estariam sempre entre nós (Marcos 14:7). Ou quando outro candidato promete "liberdade" que não pode dar. A verdadeira liberdade está em Jesus (João 8:36).
Em contrapartida, o polemista americano Ben Shapiro menciona Thomas Jefferson para contradizer a ideia de política como fonte de felicidade. Segundo ele, a existência do estado/governo é para proteger o direito das pessoas. É para evitar que alguém roube o que é seu e provoque destruição em sua propriedade.
Ao que parece, um número considerável de candidatos, tão logo termina a contagem dos votos e se sagre vitorioso, vira as costas para o povo. A iniciativa de um político em se tornar "povo" quase sempre tem como objetivo o de se tornar "príncipe" como bem disse Maquiavel.
Em suma, para alcançar o status de príncipe, há candidatos que de uma hora para outra assumem a humildade de um Francisco de Assis e saem pelas ruas, pelas palafitas, pelos becos e labirintos rodeados de casebres; eles comem e bebem com os pobres e ainda lhes doam coisas passageiras e até dinheiro, que a princípio parece ser vantajoso, mas que no momento em que o estômago esvazia novamente, não há como reclamar depois.
O político no contexto de sua campanha eleitoral parece ser mais fervoroso do que um missionário ao pregar o evangelho. Ele reúne sua equipe, dá orientações, sai de porta em porta, panfleta, abre sua cartilha com a mesma devoção que abre a Bíblia e ainda promete cura para as mazelas humanas.
Por consequência, a situação é tão viciante que a cada quadriênio o círculo se repete e quando no poder, a tendência é desfazer o que de bom foi construído. É a máxima maquiavélica na prática: "aquele que promove o poder de um outro perde o seu". Essa sentença de Maquiavel é tão egoísta que se torna diabólica. Infelizmente é o que acontece, pois há sempre a interrupção de bons programas de gestores anteriores com a desculpa de que o novo será melhor.
Envolvimento Cristão
É bastante comum ouvirmos que os cristãos não devem se envolver em política. Claro, que, com a laicidade do estado, deve haver uma separação entre igreja/estado até no que se refere a política.
Nessa mesma lógica, também deveria valer para entidades e sindicatos com ênfases partidárias, uma vez que as ideologias neles contidos possuem caráter religioso.
Por que o envolvimento cristão?
De acordo com John Stott, "existem apenas duas posturas que os cristãos podem adotar em relação ao mundo [política]. Uma é a fuga; a outra, o envolvimento". Ele ainda acrescenta uma terceira: "a acomodação". Para Stott, essa última postura "significa que os cristãos se tornariam indistinguíveis do mundo e que não seriam mais capazes de desenvolver uma postura distintiva em relação a ele".
Em detrimento da situação atual do mundo, o povo cristão deveria estar mais antenado acerca de assuntos políticos, sem politicagem, claro. Não no sentido de se aproveitar das pessoas, mas auxilia-las para o melhor de suas vidas e para apresenta-las o Reino de Deus.
Imagina se em cada lar cristão quando uma criança nascesse e sonhasse em ser político, os pais investissem no potencial desse filho! Imagine essa criança com a educação do lar e mais a responsabilidade da escola em potencializar esse sonho! Certamente, a formação política da nação seria outra.
O grande problema é que parece não haver interesse das famílias cristãs em função do medo. Tanto as famílias quanto a igreja parecem ter o medo de que a pessoa se corrompa. Porém, é necessário compreender que a pessoa que mais deveria ter medo de confiar algo ao ser humano é Deus, pois Ele sabe de todas as coisas e vê o ser humano constantemente com o pé sobre a navalha.
Concomitante a esse entendimento, há um pensamento calvinista que se enquadra na categoria de "graça comum". E, Nancy Pearcey chega a dizer que a "graça comum funciona como um testemunho da bondade de Deus". Pearcey enfatiza que, a "regularidade da ordem natural permite que os seres humanos produzam alimentos, criem famílias, inventem tecnologias e mantenham algum nível de ordem cultural e cívica".
Quem dera se as famílias compreendessem melhor essa questão! Haveria mais investimento e preparo para que os filhos desde cedo desenvolvessem suas vocações, inclusive a vocação política. Certamente, a sociedade estaria mais protegida dos aventureiros que mal sabem administrar suas casas.
Talvez o maior culpado disso seja o voto por amizade, compaixão, filiação partidária e até por influência religiosa. Os eleitores deveriam ter a consciência de que não se viaja num avião se o piloto não for habilitado.
No que se refere a separação política/religião, tanto o padre, o pastor ou qualquer líder de outro movimento que misturem as coisas deveriam focar apenas em exercer o dom a que foram chamados. Um grande exemplo é Billy Graham quando chamado a ser político, respondeu o seguinte: "Eu não sou político, mas pregador do evangelho".
Além de ser considerado o maior pregador do século 20, Graham ficou conhecido como o "pastor dos presidentes", tamanha influência espiritual que exerceu na vida de presidentes americanos.
Ademais, tem as figuras de Don Giovane Bosco e Ellen White, ambos viveram no século 19. O primeiro foi um padre que revolucionou as ruas de Turim, na Itália, ao lutar contra o sistema através de sua fé e vocação para salvar a vida de menores infratores ao criar a rede salesiano de ensino. A segunda, através de sua fé e dom profético, orientou os mileritas decepcionados e ridicularizados no interior dos Estados Unidos a seguirem em frente investindo em publicações, saúde, educação e missão.
Atualmente, a rede de educação adventista originariamente orientada por White, é a segunda maior rede de escolas confessionais do planeta. Ficando atrás apenas das escolas católicas. E sem contar, que, o grande movimento reformatório de saúde no mundo tem a participação dela. Até hoje, as suas mais de 100 mil páginas escritas, transformam a vida das pessoas.
Que os líderes religiosos de nosso tempo procurem separar as coisas. Que sejam participativos como cidadãos, especialmente em favor dos menos favorecidos e na defesa da justiça, especialmente se precisar interceder junto as autoridades. Contudo, evitem partidarismos e exposição políticas. O religioso foi chamado para equalizar os ânimos e auxiliar na transformação de vidas.
Cenário político brasileiro
No que se refere ao contexto político nacional o que mais se observa são candidatos que não possuem planejamento estratégico; gerenciamento de tempo; não conhecem planilhas para análise financeira; são pessoas que gastam mais do que arrecadam; pois em casa gastam mais do que ganham;
Haja vista, na maioria esmagadora das vezes não sabem o valor de 1 milhão de reais, pois sequer chegaram aos 100 mil de patrimônio e jamais geraram riqueza, emprego e renda para alguém. Por isso, quando chegam ao poder, há deslumbre e gastança sem limites. O contrário também é verdadeiro, há gente rica que entra para a política e sem pudor multiplica o patrimônio com recursos que seriam usados para o bem das pessoas.
Claro, que, toda regra tem sua exceção. Há inúmeros políticos espalhados pelo país que não possuem a noção do que foi citado acima, mas tem algo mais importante: sabedoria e honestidade. Imagine pessoas sábias e honestas treinadas com as melhores ferramentas para servirem ao país! Sejam elas ricas ou pobres. Se cada político honesto der o seu melhor em prol das pessoas, haverá diferença na vida delas.
Portanto, nestas eleições, fique mais antenado. Avalie o histórico do candidato e veja o que de fato ele contribui ou contribuiu para a sociedade. Observe se ele/ela é um bom pai, uma boa mãe, um bom esposo, uma boa esposa, um bom empregador, um bom funcionário, como é sua vida em sociedade, como trata as pessoas, se paga as contas ou se dá calote...
Ah, procure observar se ele conduz a política como um sacerdócio. Isso fará toda a diferença, pois gostar de gente e trabalhar de forma altruísta para as pessoas deve ser a marca de quem se envolve na política.
Bom, espero que esta reflexão auxilie você a decifrar melhor a política e os seus políticos, do contrário, ao invés de decifrar o enigma como fez Édipo, o monstro do poder pode querer te devorar.
E mais um detalhe: o único que tem o poder de consertar a alma, matar a fome de todos, oferecer liberdade e um novo modelo de gestão de cidade, é o Senhor Deus. O resto, é papo de campanha eleitoral.
REFERÊNCIAS
1. William Kristol, "It's All about Him", The New York Times, 25 de fevereiro de 2008, (http://www.nytimes.com/2008/02/25/opinion/25kristol.html).
2. Ben Shapiro, "O Lado Certo da História: como a razão e o propósito moral tornaram o Ocidente grande. Rio de Janeiro: Alta Books, 2019, p. 2.
3. Nicolaus Maquiavel, O Príncipe, Porto Alegre: L&PM Pocket, 1998, p. 6,19.
4. John Stott, O Cristão Em Uma Sociedade Não Cristã. Rio de Janeiro: Thomas Nelson, 2019, p.22.
5. Nancy Pearcey, A Busca da Verdade. São Paulo: Cultura Cristã, 2018, p. 25.
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Muito bom texto. Política é assunto bem polêmico e por vezes enfadonho, mas precisamos nos inteirar para não sermos engolidos pelos políticos cafajestes que é a grande maioria.
ResponderExcluirSábias palavras e reflexões acerca dos envolvimentos políticos de cada um de nós, cristãos...
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