A vitória sobre o mal

 

Por Célio Barcellos

Quase sempre ao entardecer, da janela do meu escritório vejo uma pintura a céu aberto. É um descanso para as retinas fatigadas com os borrões deste planeta. 

A linda foto acima é uma tela natural que O Artista YAHWEH, Designer do Universo me presenteou. Certamente, Ele também presenteou a você, pois em toda parte do planeta a pintura aparece, mesmo que de maneira variada, pois Ele diversifica Suas artes. 

Pois bem, estava eu extasiado com a paisagem, e de repente me veio à mente “Na ribeira do Eufrates assentado”, um dos sonetos de Camões. 

O lindo céu dourado e com nuvens estáticas me fez por alguns instantes flutuar e discorrer os pensamentos na direção de algum lugar. 

Eu não sou Camões e nem tão pouco lusitano. No entanto, os sentimentos de um portuga, de um hebreu ou até mesmo de um brasileiro, se tornam simbióticos quando a contemplação invade o ser. 

A capacidade de imaginar tem sido neutralizada pelas muitas distrações. Se exercitarmos o nosso cérebro no aprendizado do latim, compreenderemos que o escrever corretamente para um gramático raíz é "guardar a pureza da linguagem", como bem disse Fernão de Oliveira, autor da primeira gramática do português. 

Para os defensores da linguagem dos tempos de Oliveira, as obras clássicas eram um tesouro e compreende-las fazia parte da preservação do vernáculo. Era uma espécie de antídoto para uma confusão à semelhança do que ocorreu em Babel.

Será que se valorizássemos os clássicos, não teríamos melhor entendimento das coisas? Inclusive compreenderíamos melhor as páginas sagradas da Bíblia, o clássico, dos clássicos. 

Em meu período universitário tive a oportunidade de ser aluno do Dr. Milton Luiz Torres. Eu fazia questão de anotar o máximo de seus ensinamentos. Era como uma esponja que sugava tudo. 

O Prof. Torres conseguiu despertar em mim um gosto a mais pela leitura ao citar os muitos clássicos. Ele é daqueles mestres, que, ou você o ama, ou você o odeia. O Prof. Torres era totalmente comprometido com o que fazia e não se importava com o que pensavam dele. 

Visita do casal Torres em meu lar

Particularmente, tive a grata satisfação de estreitar relacionamento de amizade com o Torres. A amizade ultrapassou os limites da sala de aula. 

Apesar do seu vasto currículo acadêmico, exímio linguista e tradutor e intérprete, sempre que solicitei alguma coisa ao Dr. Torres, ele me atendeu com toda boa vontade e simplicidade. 

Ainda que o contato tenha sido uma dúvida acerca de um verbete em grego, por exemplo. Só para deixar claro, o Milton Torres tem paixão pela língua grega e devoção pela Bíblia. 

Atualmente, ele e a sua esposa, Tania Torres estão lecionando em um estabelecimento de educação próximo a Boston/EUA. Quem me dera ter recebido a influência do Milton Torres desde o fundamental! 

Mas voltemos ao pôr do sol e a Camões. Não estou no Eufrates, e nem em terras lusitanas, porém, em Jaguariúna, localizada em São Paulo e pertencente a um país chamado Brasil.

Em meio às minhas atividades profissionais e atenção à família, procuro separar tempo para aprender coisas que outrora deixei de ver. Compreendo que estou distante de um real domínio da gramática e preciso melhorar em muito a minha escrita. 

Ao ler Camões por exemplo, percebo que a minha formação para o entendimento de obras no formato de decassílabos, da utilização de  elisões, dos quartetos e tercetos, não foi suficiente para o que preciso hoje.

Talvez, por minha própria culpa, uma vez que eu poderia ter me aplicado mais aos estudos no período de minha adolescência. 

Neste soneto, Luis de Camões discursa em pensamentos sobre a glória. Mas, que tipo de glória seria essa? 

Para Camões, apesar do exílio babilônico, a vitória era algo concreto na mente de um hebreu. 

Essa glória, é a vitória sobre o mal. 

Olha que interessante! um escritor medieval valorizava não somente os escritos de Aristoteles, Platão, Homero, Virgílio e cia.  A Bíblia fazia parte de seu repertório literário, não somente por ser um clássico, mas o livro sagrado. 

Desprezar a Bíblia como alguns insistem é desprezar o saber. Até porque, muito antes dos clássicos gregos e até mesmo da alfabetização ocidental, os judeus já haviam escrito a Torá algumas centenas de anos antes. 

Nesse discorrer sobre a glória, pode ser que o poeta português esteja associando a história dos hebreus, com a sua própria condição de exilado ou até mesmo mencionando acerca de exílios existentes.

Nos tempos das monarquias medievais era bastante comum o rei enviar um desafeto ou subversivo para além mar. 

Eis a pérola de Camões:

Na ribeira do Eufrates assentado, 

discorrendo me achei pela memória

aquele breve bem, aquela glória,

que em ti, doce Sião, tinha passado.

Da causa de meus males perguntado

me foi: - Como não cantas a história 

de teu passado bem, e da vitória

que sempre de teu mal hás alcançado?

Não sabes, que a quem canta se lhe esquece

O mal, inda que grave e rigoroso?

Canta, pois, e não chores dessa sorte.

Respondo com suspiros: - Quando cresce 

a muita saudade, o piedoso 

remédio é não cantar senão a morte. 

Portanto, neste entardecer, da janela do meu escritório vejo essa pintura natural. Não estou no Eufrates, mas próximo ao Jaguary, rio que serpenteia a região. À semelhança dos hebreus, aguardo a glória do Oriente, do Rei que já é vindo secar o Eufrates, da Babel, que escraviza gente, mas que em breve cairá. 

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